De fato, esvaziar-se deve ser o primeiro passo para quem realmente quer aprender, principalmente quando se "aprende" de forma errada. O segundo é reconhecer que nunca sabemos o bastante e pode acontecer de termos desperdiçado nossas vidas aprendendo de quem nunca deveria ter ensinado. Tive um professor de Teoria Literária na UFRJ que era um terror, porque "forçava" os alunos a irem para a biblioteca se educarem. Às vezes ele era tão irônico que o pessoal ficava revoltado, ora com ele, ora consigo mesmos. Os que se revoltavam consigo mesmos reconheciam o quanto poderiam ter aprendido se, desde o início, tivessem quem os guiasse pelo caminho correto na busca do conhecimento.
Quando comecei lecionar Matemática em uma faculdade do Rio de Janeiro, eu me lembro que estreei pegando uma disciplina na turma de calouros do Bacharel em Matemática chamada Matemática I-II. Na ementa da disciplina constava que o curso deveria ser uma revisão e aprofundamento do que esses calouros haviam "aprendido" no Ensino Médio. Eu, sendo negro e um garotão, pois tinha apenas 26 anos e ainda morava na Baixada Fluminense. Os alunos, boa parte de classe média, se é que ainda existe isto mesmo no Brasil, primeiramente desdenharam a disciplina, não sei se também do mestre. Como se dissessem: "Tudo de novo?"
Minha proposta metodológica de curso não foi tão trivial como eles pensavam. Comecei revendo as bases teóricas da matéria que eles pensavam que já sabiam, vendo-as mais de cima. Em seguida, eles mesmos descobriram que, se sabiam, não tinham aprendido do jeito que eu a estava apresentando. Em seguida, fugindo das trivialidades, passei a trabalhar com eles os problemas de matemática "difíceis" do IME e do ITA, considerados os mais temíveis do Brasil. Eles ficaram surpresos, uma vez que jamais poderiam imaginar que algum dia seriam capazes de resolver problemas dos concursos vestibulares do Instituto Militar de Engenharia!
Como o curso visava a formar matemáticos, prossegui proporcionando meios de desenvolvimento da capacidade de percepção dos aspectos cognitivos envolvidos na resolução de problemas matemáticos. Nada melhor do que uma reflexão epistemológica para aguçar a mente deles quanto aos processos cognitivos subjacentes ao fazer matemático. Eles precisavam de desenvolver a capacidade de pensar como quem elabora um problema matemático, não deveriam apenas se contentar em saber resolvê-los.
Demos um passo à frente e aconteceu como na história dos sapos que viviam em um poço e pensavam que o mundo era apenas aquilo que eles contemplavam ali dentro e, quando olhavam para cima, naquela região indecifrável que se revelava além da boca dos poços. Certo dia, após uma forte chuva, eles foram expulsos desse "universo" restrito e descobriram que o mundo não se resumia no poço em que viveram a vida toda. Aconteceu mais ou menos assim com meus pupilos. O mundinho deles se ampliou quando lhes apresentei os problemas das Olimpíadas Brasileiras de Matemática. Foi um “delírio” coletivo, no bom sentido. Para ampliar mais os horizontes deles, como pensavam que estavam no fim da jornada, apresentei-lhes também projetos de resolução das Olimpíadas de Matemática da Hungria e da Rússia. Meu enfoque era sempre centrado nas resoluções e no processo cognitivo subjacente a elas. Finalizando o curso, por falta de tempo necessário para mais avanços, fomos aos problemas das Olimpíadas Internacionais de Matemática.
Quando o curso terminou, a visão deles sobre como aprender e ensinar matemática mudou radicalmente. Para a maioria deles, desenvolver o hábito de pensar como matemáticos em apenas um ano foi muito melhor e mais prazeroso do que todos os anos de estudo que tiveram. Pude mostrar a meus pupilos que a carreira deles só estava começando. Muito ainda estava por vir.
Prof. Fabiano Ferreira
Minha proposta metodológica de curso não foi tão trivial como eles pensavam. Comecei revendo as bases teóricas da matéria que eles pensavam que já sabiam, vendo-as mais de cima. Em seguida, eles mesmos descobriram que, se sabiam, não tinham aprendido do jeito que eu a estava apresentando. Em seguida, fugindo das trivialidades, passei a trabalhar com eles os problemas de matemática "difíceis" do IME e do ITA, considerados os mais temíveis do Brasil. Eles ficaram surpresos, uma vez que jamais poderiam imaginar que algum dia seriam capazes de resolver problemas dos concursos vestibulares do Instituto Militar de Engenharia!
Como o curso visava a formar matemáticos, prossegui proporcionando meios de desenvolvimento da capacidade de percepção dos aspectos cognitivos envolvidos na resolução de problemas matemáticos. Nada melhor do que uma reflexão epistemológica para aguçar a mente deles quanto aos processos cognitivos subjacentes ao fazer matemático. Eles precisavam de desenvolver a capacidade de pensar como quem elabora um problema matemático, não deveriam apenas se contentar em saber resolvê-los.
Demos um passo à frente e aconteceu como na história dos sapos que viviam em um poço e pensavam que o mundo era apenas aquilo que eles contemplavam ali dentro e, quando olhavam para cima, naquela região indecifrável que se revelava além da boca dos poços. Certo dia, após uma forte chuva, eles foram expulsos desse "universo" restrito e descobriram que o mundo não se resumia no poço em que viveram a vida toda. Aconteceu mais ou menos assim com meus pupilos. O mundinho deles se ampliou quando lhes apresentei os problemas das Olimpíadas Brasileiras de Matemática. Foi um “delírio” coletivo, no bom sentido. Para ampliar mais os horizontes deles, como pensavam que estavam no fim da jornada, apresentei-lhes também projetos de resolução das Olimpíadas de Matemática da Hungria e da Rússia. Meu enfoque era sempre centrado nas resoluções e no processo cognitivo subjacente a elas. Finalizando o curso, por falta de tempo necessário para mais avanços, fomos aos problemas das Olimpíadas Internacionais de Matemática.
Quando o curso terminou, a visão deles sobre como aprender e ensinar matemática mudou radicalmente. Para a maioria deles, desenvolver o hábito de pensar como matemáticos em apenas um ano foi muito melhor e mais prazeroso do que todos os anos de estudo que tiveram. Pude mostrar a meus pupilos que a carreira deles só estava começando. Muito ainda estava por vir.
Prof. Fabiano Ferreira